Thursday, 29 November 2007

A IMPORTÂNCIA DO RITO




Photo Denis Olivier


As palavras confundem-se um pouco e detenho-me a percebe-las. Só porque me interessa definir para mim mesma o que sinto com exactidão, sem o deixar flutuar ao sabor de imprecisões.

Pormenores, talvez. Mas as grandes diferenças residem precisamente aí, intrincadas nos detalhes que passam despercebidos ao comum dos mortais. É pelos pormenores que um expert conhece a diferença entre a coisa verdadeira e a imitação.

Parece nenhuma ou subtil, mas é de facto enorme a diferença entre ritual e rito.

O ritual é colectivo, estereotipado, impessoal, automático e mecânico, sendo por isso pobre em termos de criatividade e sentimentos. O seu sentido inicial foi-se perdendo no tempo e pouco mais é do que a repetição de gestos vãos.

O rito, pelo contrário, tem uma raiz fortemente individual, nascida no âmago do nós. O rito enriquece, engrandece, alarga. Abre caminho. Prepara o corpo e acalma a mente para desfrutar em plenitude o que vem a seguir.

Por isso, num rito arrancado do fundo de mim, a primeira coisa que faço na presença do meu Dono é lançar-me aos Seus pés.

Não é um gesto vazio, nem meramente simbólico, nem uma cópia de gestos de outros, é o resultado de uma força interior que me impele naturalmente para baixo, inspirada pelo poder do meu Dono. Sou eu inteira num gesto. Condensada num instante carregado de significado, que saboreio a conta-gotas.

Este é para mim, O momento. É aqui que eu na verdade me entrego, me ponho à Sua disposição.

Na natural continuação deste, vem o seu complemento. O momento em que me toma. O momento em que docilmente ofereço o pescoço à coleira para simbolizar a posse total do meu Dono sobre mim.

Este gesto une-me irremediavelmente ao meu Dono, retira-me o que sobra de individualidade e de independência. Circunscreve-me à Sua órbita.

Depois, intuitivamente encontro outros gestos, outras formas de celebração do Seu domínio sobre mim. Ao que se somam marcas pessoais do meu Dono, ex-líbris da sua essência única, abundantes, fecundas.

Abraço-as, interiorizo-as, torno-as minhas. Depois ofereço-as, num culto intímo e cúmplice ao meu Dono, já a abarrotar de mim.



Monday, 26 November 2007

BOM DIA, MEU DONO




BDSM TÂNTRICO


A minha submissão ao meu Dono é constante, intemporal, definitiva. Não se esgota numa sessão, num encontro, num momento. Faz parte de mim, como um orgão vital.
Contudo, é naturalmente quando estou na Sua presença que sinto a minha submissão crescer, como se fosse insuflada pela comparência.
Desde o instante em que sei que O vou ver, toda eu me transformo, como numa metamorfose, desde o fundo até à superfície. Tudo o resto se esboroa e eu centro-me Nele como se todas as minhas células acorressem a um chamamento inadiável, toda eu me desloco na Sua direcção como se fosse empurrada por uma força superior impossível de conter.
Na Sua presença, eu ajoelho-me e sinto-me a reluzir. Imóvel à espera de uma ordem, é como se eu parasse o tempo, suspendesse a própria vida. Nada importa senão estar ali, à Sua disposição. O que Ele decide fazer comigo não é preponderante.
Apaziguada pela convergência dos corpos, a minha submissão não se satisfaz no toque. Ela prolonga-se nos dias como uma mancha de tinta que alastra sobre um mata-borrão.

Se Ele pudesse ver-me por dentro, ver-me-ia como que forrada a entrega, atapetada de obediência, inundada de submissão.



Saturday, 24 November 2007

GOLDEN SHOWERS & CO





Desde o primeiro minuto que tudo o que me vem do meu Dono me é natural. Não estranho nada que seja Seu, como se o meu corpo fosse uma extensão do Seu próprio e tudo que é Dele viesse naturalmente desaguar em mim . A abolição de barreiras e diques entre um corpo e outro. Secreções, fluídos, todos os Seus sucos eu recebo com prazer e devoção. Um misto de doce humilhação e extrema intimidade, momentos de intensa partilha. A Sua saliva a dissolver-se devagar na minha boca, como uma mousse cremosa. O Seu sémen espesso e levemente picante a escorrer-me pela cara, pelo peito, colado à minha pele, aos meus cabelos, que me esforço por tentar alcançar com a língua. O Seu mijo quente em jorros sobre o meu corpo - o odor acre, o sabor metálico - ou copiosamente despejado dentro de mim a ensopar-me as entranhas, conduz-me a estados de profunda submissão e de prazer sem limites. Uma sublime mistura de substâncias corporais, um raro batido de líquidos privados, um cocktail exótico de humores que me nutre e revigora o corpo e a alma.




Wednesday, 21 November 2007

EMPRESTADA


Sai de casa à hora marcada. A gabardine discreta não fazia imaginar a minha nudez. Unicamente meias pretas de liga e sapatos "fuck me". Subi a gola, para encobrir a coleira. Cabelo apanhado, mãos nos bolsos, olhos no chão. Tudo tal qual me fora ordenado pelo meu Dono.

" E fazes exactamente tudo o que te for mandado, como se fosse eu a ordenar."

A porta do carro abriu-se, eu entrei para o banco da frente, sem levantar o olhar. Foi-me de imediato colocada uma venda e, sem uma palavra, o carro arrancou. Ao princípio consegui seguir o trajecto mas rapidamente perdi a noção do rumo que tomavamos.

Recapitulei : havia pelo menos duas pessoas no carro. Uma atrás de mim, que me tinha vendado e a quem eu sentia agora a respiração pesada, e o condutor. Não fazia a mínima ideia onde ía nem com quem ia. Sentia-me pendente num ponto indefinido entre o medo e a excitação. Percebi que tínhamos deixado a cidade, pelo piso, pela escuridão e porque deixou de haver semáforos o que foi um alívio pois cada vez que paravamos eu inquietava-me com a ideia de que o condutor do carro ao lado me estivesse a ver com a venda nos olhos.

As pessoas a quem eu estava entregue continuavam sem trocar uma única palavra, não havia música, só o carro a deslizar sobre a estrada lisa.

Seguimos por essa estrada durante bastante tempo, depois devemos ter apanhado uma estrada secundária porque o piso era agora irregular e seguíamos bastante mais devagar.

Ao fim de mais algum tempo o carro parou.

Pela primeira vez desde que saíramos, certamente em mais de uma hora de viagem, uma das pessoas falou : - Vai à frente e abre. Eu levo-a. - uma voz grave de homem.

A porta abriu-se e eu senti um puxão. Fiz força para me levantar mas ainda assim desiquilibrei-me e quase caí.

O homem agarrava-me por um braço e ora me puxava ora me empurrava para me manter num caminho estreito de acesso ao sítio para onde me levava. Subi um degrau e a porta fechou-se atrás de mim, fazendo um estranho eco.

O homem levou-me mais uns passos e fez-me parar. Retirou-me então a venda e fez-me descer uma escada íngreme, mantendo-se atrás de mim. Quase não havia luz o que tornava tudo bastante mais difícil.

Cheguei finalmente a uma sala ampla, totalmente vazia, excepto a um canto uma mesa grande de aspecto robusto. Os meus olhos, sempre baixos, foram-se habituando a outro tipo de escuridão e comecei a conseguir vislumbrar na minha frente uma espécie de cavalete de madeira, que me dava um pouco abaixo da cintura.

" Tira a gabardine". Tirei por fim as mãos dos bolsos e deixei escorregar a gabardine. "Curva-te". Dobrei-me sobre o cavalete. Foi então que vi duas enormes argolas de metal, chumbadas no chão de cimento, afastadas cerca de 60/70 cms. O homem à minha frente, baixou-se e percebi então que estava encapuçado. Prendeu-me cada pulso com uma corrente forte e cada corrente a uma das argolas.

Subitamente percebi o outro homem atrás de mim. "Abre as pernas" - enquanto me puxava pelo tornozelo e me fazia exactamente o mesmo a cada perna, prendendo as correntes a outras duas argolas atrás de mim.

Fiquei dobrada sobre o cavalete, braços e pernas abertos e presos por grossas correntes às quatro argolas no chão. O meu coração batia descompassadamente. "Confio no meu Dono, confio no meu Dono" foi a única coisa que consegui pensar.

Tuesday, 20 November 2007

KIT DA ESCRAVA



Tenho um problema com as meias de liga. Na hora em que mais preciso delas, ou tem uma malha caída, ou não encontro duas iguais, ou as bandas de silicone estão frouxas. Como em média tenho entre dez a vinte minutos para me pôr pronta desde que o meu Dono se faz anunciar, é fácil imaginar o meu desespero para encontrar um par apresentável. Remexo as gavetas como um perdigueiro a escavar na toca dum coelho. Meias avulso voam pelo quarto. Suspiro de alívio quando consigo encontrar duas em boas condições. Até descobrir que a segunda tem afinal um buraquinho minúsculo. Que só vejo quando já vesti a primeira.

Foi por isso que resolvi ser uma escrava previdente e preparar aquilo que pomposamente baptizei como "kit da escrava". Tem que conter no mínimo dois a três pares de meias de liga impecáveis, lisas, com costura e de rede, cintos de liga com os reguladores na altura certa, várias cuequinhas sexy, que devo vestir por cima do ligueiro e não ao contrário. Como o meu Dono não me quer de soutien, menos uma preocupação. Mesmo que isso signifique não poder usar o corpete preto com borboletas cor de rosa de que tanto gosto ou aquele soutien a condizer com a barra vermelha das meias que há tempos me fez perder a cabeça. Tenho também sempre à mão algumas saias ou vestidos pretos de vários comprimentos, conforme a ocasião e uns tops decotados. A coleira está sempre acessível, pendurada no meu quarto junto às cordas de juta japonesa, num sítio onde as posso ver antes de dormir e logo que acordo. Os sapatos ou botas prontos a calçar.
Para manter a coisa equilibrada, guardei tudo numa caixa de cartão com anjinhos da guarda.




Monday, 19 November 2007

ESTADO DE TANTO FAZ


Quando estou com o meu Dono, como se me ligasse à corrente, entro de imediato em estado de tanto faz.
Tanto faz se me acho bonita ou feia, tanto faz o que foi ou o que poderia ter sido, tanto faz que o mundo acabe amanhã, tanto faz tudo o que se passa à minha volta, tanto faz o que os outros pensam. Tanto faz que o empregado ache que Ele é mudo ou que as meias me escorram pelas pernas abaixo, tanto me faz que chova ou que o amor seja "fogo que arde sem se ver". Na verdade tanto me faz o amor. Tanto faz se é um pato ou uma sandwich de tofu. Tanto faz o passado, tanto faz o futuro. Tanto me faz tudo que não seja Ele.

Sunday, 18 November 2007

CASTIGO


Saio do carro, atordoada. Estranho, sentir de imediato o frio cortante em todo o meu corpo, excepto no rabo que arde como se estivesse sentado sobre brasas.
- Sobe a saia e ajuda-me a estacionar.
Duas pessoas a subir a rua do outro lado e eu a tentar ganhar tempo, - Subo, como?

Ainda tenho tempo para pensar se será de mim ou a noite estará mesmo gelada.

O meu Dono estaciona o carro e sai. Em vez de fechar a porta, levanta o banco e senta-se atrás. Eu parada, sem compreender, deixo temporariamente de sentir o frio ou o que quer que seja.
- Entra.
Eu entro, ainda assim descontraída, mas percebo rapidamente que não é hora de recreio. O meu Dono puxa-me à bruta a perna entre as Suas e obriga-me a deitar no Seu colo. Levanta-me a saia, o rabo exposto a quem quer que passe junto ao carro.
Nunca tinha sentido a Sua mão tão pesada desabar tão brutalmente sobre mim. Durante alguns minutos, bateu, bateu, bateu. Sem intervalos entre uma pancada e outra. Acompanhada da respectiva "explicação" para que não restem dúvidas sobre o tema da obediência. E do agradecimento da escrava, entre lágrimas.

Saio do carro, atordoada. Estranho, sentir de imediato o frio cortante em todo o meu corpo, excepto no rabo que arde como se estivesse sentado sobre brasas.

Quando não se apanha há já algum tempo, parece que dói mais.


Friday, 16 November 2007

ESCRAVA PREDADORA


A lua começa a crescer, a escrava começa a vestir a pele da predadora.

Abre-se uma fresta no meu quadradinho por onde me esgueiro, ágil e determinada, na busca da presa. Toda eu me transfiguro, numa inesperada mutação.

De dócil animal de estimação a cadela de fila ansiosa por presentear o Dono com a presa ainda quente, intacta entre os cuidadosos dentes aguçados.


De bicho enjaulado a felina esfomeada que traz intocado o troféu da caçada ao macho dominante e, a arfar do esforço , baba a escorrer, se deita à distância, debaixo do sol intenso da savana a ve-Lo degusta-lo, anestesiada pelo prazer e pela fome.



Thursday, 15 November 2007

AS CORES DA (SUA) ESCRAVA


A minha submissão ao meu Dono, embora constante não é sempre igual. Sinto-a de incontáveis formas diferentes, e de diferentes formas a manifesto.

Às vezes chega devagar, a percorrer-me toda como uma ligeira comichão interior, agradável e mansa. Nesses momentos, sou uma escrava suave, terna, branda. Toda eu sou véus e transparências e sinto-me em delicados tons de azul.

Outras vezes vem-me de forma arrebatada e física, entrelaçada de insaciável desejo carnal, de inconfessável luxúria, de paixão afrodisíaca e eu, estremecida de volúpias, vejo-me em cenários de sedas e veludos raros e sou da cor das especiarias .

Vezes ainda sinto-a chegar-me acima em golfadas que quase me asfixiam, sinto-a invadir todo o meu corpo como um vírus que me consome por dentro, me deixa quente, febril, me faz passar rapidamente do estado sólido ao estado submisso. Nessas alturas, em que tudo em mim é submissão efervescente e a única coisa que me alivia é sentir na pele o Seu poder absoluto, eu sinto-me como a matéria-prima a que o meu Dono dá forma e sou da cor que Ele escolhe.

Tuesday, 13 November 2007

DELE, TREZENTOS E SESSENTA E CINCO DIAS


A Terra fez uma volta completa em torno do Sol. Trezentas e sessenta e cinco voltas sobre si mesma. Trezentas e sessenta e cinco noites e trezentos e sessenta e cinco dias. Trezentas e sessenta e cinco hipóteses de desistir ou de começar de novo. Coisas que nasceram e coisas que morreram. Ciclos que se iniciaram e ciclos que se completaram. E eu, sou Dele.

FANTASMAS


Antes de existir corpóreo na minha vida, o meu Dono já existia translúcido no meu imaginário. Quando ouvia falar Dele, quando lia qualquer comentário Seu, qualquer coisa dentro de mim mudava de lugar. Nessa altura eu não sabia, mas foi provavelmente aí que, comecei a reencontrá-Lo. Reconheci-O talvez pelo que não dizia, muito antes de qualquer outra coisa. Como se o farejasse à distância, muito antes de Ele dobrar a esquina e ficar, finalmente, visível. Andamos perto, muito perto. Mas não era suposto ser assim.
Então, estranhamente, com a inevitabilidade de uma profecia que se cumpre seja de que forma for, aproximamo-nos um do outro sem saber, pelos nossos próprios meios. De mim, Ele conhecia meia dúzia de pensamentos e as pernas enevoadas, mas só um pouco mais tarde as ligou a mim, as pernas que saíram de casa a correr no meio da noite, como se o chão abrisse fissuras no momento em que o pisava. Não havia pois outro caminho senão para a frente, desamparada para Ele. E não foi a chuva torrencial nem o vento que quase me levantava do chão que me impediu de me ajoelhar de imediato a Seus pés. Suponho que quis apenas encher o peito de ar antes de mergulhar no fundo de nós.

Saturday, 10 November 2007

IN THE CAGE



O meu Dono dá-me bastante liberdade. À primeira vista pode parecer paradoxal, uma escrava sentir-se livre. Mas, se dominar é condição essencial para prender, prender não é de todo necessário para dominar. Dominar alguém que está preso não tem na verdade grande mérito. A arte de dominar está precisamente em subjugar alguém que é livre. Possuir uma escrava livre não é pois para qualquer um. Só quem sente poder absoluto sobre a Sua escrava, se pode dar ao luxo de a deixar solta quando muito bem entende. Com a certeza tranquila de que basta um gesto, um olhar, um pensamento para a ver de imediato rastejar aos Seus pés.




" Deixe os que sabem escalar montanhas, escalá-las; deixe os que não sabem, consolar-se negando sua existência. " Rogue of Gor