Monday, 29 October 2007

A QUATRO MÃOS


O meu Dono afagou-me os cabelos, distribuiu festas pelo meu lombo, depois, com um gesto, mandou-me segui-Lo.

Fiquei feliz quando vi as cordas. Adoro quando me amarra : sentir a restrição, o ar rarear, a crescente vulnerabilidade a que me sujeita, transporta-me para estados alterados de consciência. Atou-me o peito num shinju apertado, prendeu-me as mãos atrás das costas. Pela primeira vez, colocou-me uma venda nos olhos e tampões nos ouvidos. A minha pele passou a ser o único orgão de contacto com o exterior, tudo o resto era eu.

De joelhos, cega e surda, o prazer indiscritível de não saber o que se vai passar a seguir. Os minutos parecem mais longos, as sensações mais marcantes, os sentimentos mais profundos. Tudo ganha uma nova dimensão, elástica, extensível, maleável.

Sinto o corpo a minha frente. As duas mãos que me seguram a cabeça e ma orientam. Sorrio intimamente. Adoro dar prazer ao meu Dono, descobri um gosto em mim que me era desconhecido, um prazer que é meu mas cujo epicentro não está em mim, mas Nele.

Sinto o sexo forçar-me os lábios. De repente, há qualquer coisa em mim que desaba. Não reconheço a textura, não reconheço o sabor, não reconheço o cheiro daquele corpo. O meu cérebro tenta processar as informações, quase vejo os neurónios desconcertados a tentar cruzar os dados. Luzes vermelhas a piscar, o alarme a disparar. Alguma coisa em mim tenta ainda desacreditar, tenta fazer com que pareça impressão minha, tenta convencer-me do contrário, mas eu sei que não é assim.

Enquanto o caos continua dentro de mim, sinto duas mãos agarrar-me as ancas. O meu cérebro conta vertiginosamente as mãos sobre mim. Duas continuam a agarrar-me a cabeça, a forçá-la em movimentos de vaivém. Outras duas agarram-me vigorosamente pelos flancos.

Perante a evidência, a rendição.
As lágrimas rolam-me pela cara. Mantenho-me no limbo ainda algum tempo, indecisa entre a repulsão e a atracção.

O meu Dono arranca-me a venda.

"Sabes quem é? O j. O escravo que recusaste."

4 comments:

Zebra said...

Ao saber que dás prazer, não terás tu ainda maior prazer?

Anonymous said...

aprecio o estilo a raiva interior e a paz o registo erudito e a explanação de alma. aprecio a nobreza a cumplicidade compartilhada. aprecio a semiótica litúrgica e literáriamente evoluidas; aprecio a cultura subsequente e sensível, a cada análise e a cada reflexão. Aprecio a funda e sincera persistência e a visível luxúria de pertencer. Interrogo-me, como Dono eu também de uma mulher de topo sobre a natural selectividade de tudo isto.
gostaria de convidar- obviamente o seu Dono - a uma permuta de ideias. Que levasse potencialmente à criação de uma "loja" onde a verdadeira classe e o entendimento superior fizessem esquecer, tanto quanto me é relatado, as gatherings pífias e sem jeito que descredibilizam o bdsm por cá. Uma casa de elegância e funda cumplicidade. Queira, por favor, na sua fina sensibilidade, veicular esse desejo ao seu Dono JB, que deve ser, por uma questão de expectativa natural, um homem de finura e elevação de entendimento. Respeitosamente, APB brutissimus@hotmail.com

Sua escrava said...

u ó mãe : Dar prazer ao meu Dono é o meu supremo prazer. Obrigada pela visita, também já andei a cuscar o teu blog. beijos

Sua escrava said...

brutissimus : é muito bom constatar que há quem entende o que dizemos, mesmo quando as palavras são insuficientes para expressar tudo quanto sentimos. Mas melhor ainda é quando encontramos quem consegue ler o que não escrevemos. Obrigada. Encaminhei o comentário ao meu Dono, espero sinceramente que possam trocar ideias e que as ideias possam dar frutos. Beijos.