"Traz-me as cordas."
Recuei, descalça, até à porta da sala, depois voltei-me e corri ao quarto a buscá-las.
Não esperava o meu Dono hoje. Tinha-me ligado de manhã, demorou algum tempo ao telefone e sei o quanto tem andado ocupado, o quanto o momento é difícil. Deixei-me ficar numa zona de conforto, quieta para não atrapalhar, quieta porque o momento não é fácil e eu sei disso tudo. Moderada. "Pensas que és o quê? Minha amiguinha?"
À mistura com outras coisas, e Ele sabe disso tão bem como se me lesse os pensamentos antes de eu sequer os pensar.
Voltei com as cordas e a coleira na mão e ajoelhei-me aos Seus pés. O meu Dono agarrou a primeira corda com ambas as mãos e esticou-a, fazendo-a deslizar entre os dedos cerrados. Atou-me com firmeza, os braços ao longo do corpo, em voltas paralelas acima e abaixo do peito. Comecei imediatamente a sentir a energia das cordas, o calor que se desprende delas como de nenhumas outras. Com a segunda corda, o meu Dono uniu na frente a anterior, e passou uma laçada à volta dos ombros até às costas, obrigando as mamas a levantar e projectar-se para a frente como se quisessem separar-se de mim. Levantou-me o antebraço, única parte solta dos braços, já que toda a zona entre os ombros e os cotovelos estava completamente imobilizada junto ao corpo, até ficar em ângulo recto. Com o resto da corda amarrou-me os pulsos, à largura do corpo. Sinto mais forte a constrição das cordas. Tem em mim o efeito narcótico de uma droga, sinto-me entorpecer em cada volta, sinto-me quebrar em cada nó.
O meu Dono arrancou-me do meu estado de letargia : "Agora sim, quero a cerveja".
Acho que já tenho alguma prática de fazer coisas amarrada, embora por vezes seja preciso uma pequena dose de contorcionismo, mas nada demais.
Voltei tão rápido quanto pude e entreguei a garrafa gelada ao meu Dono.
"De joelhos" .
Sorrio, não acredito, só nesse momento precebo que a cana fininha que tinha deixado num canto da sala, para mais tarde fazer uma gag toda hi-tech, não escapou ao olhar atento do meu Dono...
"Traz molas" - Volto a levantar-me e, como posso, trago do armário duas molas tipo alicate, que o meu Dono em tempos uniu uma à outra por um fio.
Ajoelho-me de novo em frente ao meu Dono e ofereço-Lhe as molas que me prega com força nos mamilos.
"Vai buscar a ball-gag"- o meu Dono faz-me levantar de novo, meio desengonçada e fazer mais uns quantos malabarismos para chegar à ball-gag dentro do armário.
A bola dentro da boca separa-me violentamente os maxilares, mas não tenho muito tempo para pensar no desconforto que me causa.
O meu Dono sobe o volume do som. A Beth Gibbons espalha a voz doce pela sala , nobody loves me, it's true..., agora um pouco mais alto.
Nunca antes tinha apanhado de cana. Os golpes são certeiros, precisos, concentrados. A dor é lancinante. Sobretudo quando a cana bate sistematicamente no mesmo ponto, sem intervalos para a dor se espalhar, se dissolver, e o corpo se preparar para o próximo golpe.
Deve ser por volta desta altura que deixo de me preocupar se a barriga está encolhida, se se vê a celulite ou se pareço assim tão feia vista de fora.
O meu Dono acompanha cada bordoada da respectiva explicação. Como um filme legendado, para eu perceber melhor. Não se trata de simples capricho ou de puro sadismo, embora pudesse ser, claro. Há uma razão para o meu Dono arrear em mim com os dentes cerrados e um esgar de fúria. "Tu, ou és minha escrava, ou não és. Não penses que vais deixando de ser". Estremeço de dor e vergonha. Gotas de suor escorrem-me pelas costas.
" Tens noção que a praia acabou para ti, este ano..." - Logo agora que descobri aquele areal a perder de vista, aquele mar que nem parece do norte...Paciência.
O meu Dono não mostra sinais de misericórdia. Os golpes são cada vez mais fortes.
As lágrimas saltam-me dos olhos, em jorros. De vez em quando a dor é quase insuportável e eu deixo-me cair sem forças sobre os pés. Nessas alturas, o meu Dono bate repetidamente com a cana nas molas que me trituram os mamilos e eu volto imediatamente à minha posição ajoelhada, costas direitas, de perfil para Ele.
O meu Dono aumenta a frequência e a intensidade dos golpes. Encolho-me de cada vez que sinto o braço ir atrás ganhar lanço para se abater sobre as minhas nádegas massacradas. Se me mexo muito, o meu Dono bate-me na planta dos pés, impiedosamente.
A dor atinge proporções quase intoleráveis. Eu choro, compulsivamente. "Queres diz er a safe-word?" Olho o meu Dono nos olhos, a soluçar. "Estás a suplicar que pare?". Abanei a cabeça em todas as direcções. Não devo ter sido muito clara.
A cana vai-se fazendo em pedaços. Poderia parecer que isso aligeira a dor, mas não. As pontas soltas e desencontradas actuam como as pontas de um estranho chicote e atingem para lá da zona de impacto, contornam as nádegas e rasgam a pele da coxa como instrumentos cortantes.
O meu Dono dá-me para a mão uma bola colorida. "Deixas cair a bola e é como se dissesses a safe-word". Agarrei com força a bola entre as mãos. Suspeitei que ia doer.
Lágrimas, suor, ranho, baba que me escorre em quantidades inusitadas pelo queixo, um cocktail de secreções que o meu corpo expele como uma purga. Cravo as unhas na bola. E vou-me sentindo limpa, purificada.
O meu Dono tira-me a ball-gag e começa a desatar-me as cordas. "Não, por favor, não tire!" Eu choro. O meu Dono ri-se. Agarra os meus cabelos e leva-me a cara ao chão. Depois, levanta-me bruscamente e, sem deixar de repuxar os cabelos, desata as cordas com a outra mão.
Já não me sinto estranha, nem absurda, nem ridícula. Já não me sinto uma aberração.
Sinto-me como se tivesse escalado o Evereste. Sento-me no topo, a contemplar a paisagem à volta.